Alexander Martins Vianna
Estou preocupado com a situação de alunos na UFRRJ que sofrem hostilidades mais ou menos explícitas, temperadas com (auto-)rejeição, que desembocam em depressão e isolamento social e psicológico. Estou falando de um vetor específico: a desvitalização social e psicológica de pessoas por conta de sua orientação sexual. A situação só piora se isso vem carregado com mais três fardos: racismo, liporracismo e preconceito social.
Fotografia: Alamsyah Rauf
Preocupa-me o fato de ainda haver um reducionismo biologizante na forma de se conceber ou entender a sexualidade e, pior ainda, restringi-la à questão das formas como uma pessoa faz sexo. Isso cria um efeito dominó perverso: para não se submeter à mediocridade, violência e ignorância do ambiente, muitos acabam fechando-se num mundo à parte de gueto (com um igual risco de simplificação na edificação de identidades), ou caindo em autocomiseração e autocastração, ou assumindo contra si a opressão e simplificação ambientais ao trancar dentro de si um mundo de experiências como se fosse delito.
É chato não poder compartilhar uma simples experiência de acerto ou erro de namoro ou paquera porque o ambiente é hegemonicamente heteronormativo e patriarcal. Tudo só piora quando há incompreensão no ambiente familiar ou vicinal, ou mesmo em “redes de amigos”. É péssimo para qualquer pessoa, em processo permanente de edificação, perder a esperança ou o desejo de continuar neste mundo, tornando a morte uma opção racional para interromper a dor de se sentir “anormal” e “rejeitada” em relação à hegemonia de um código social unidimensional.
Todo mundo perde quando a diversidade é interrompida. Perde-se a chance de expandir o horizonte de experiências e estranhar hábitos e categorias de percepção e avaliação sobre pessoas, mundo e coisas. Joga-se fora a possibilidade de expandir as subjetividades, sem se preocupar com rótulos ou com arranjos da condição humana em guetos ou gavetas.
Para mim, a tolerância não é mais suficiente. Precisamos ir além: para o aprendizado da pós-tolerância. A tolerância está muito carregada do jogo diferencialista entre “tolerante” e “tolerado”, “regra” e “exceção”, em coabitação e ignorância recíprocas – e tacitamente assimétricas. Simplesmente é empobrecer-se política e culturalmente enquadrar pessoas em nichos para serem codificadas como aceitáveis num quadro de normas que permanece inabalado na sua forma de permitir a “exceção à regra”.
O corpo e a consciência pertencem a cada um, mas não são ilhas: são processos inacabados até o último suspiro. O quanto de mar cada um se concede para conectar as suas continentais feridas, experiências e alegrias? Precisamos de uma educação sentimental na escola e na família, na casa e na política. Precisamos de mais empatia, dessa energia socioemocional que enxergue o Outro em sua complexidade formativa, como processo e trajetória abertos. Precisamos não nos deixar levar pela violência subjetiva. Precisamos atentar para a violência estrutural que ata a todos e fere tão profundamente que anestesia.