domingo, 15 de março de 2015

Não sou inofensivo

Alexander Martins Vianna
"Manifestação pacífica" não é manifestação, é farsa... É somente festa cívica, no pior sentido do termo – aprendemos isso com as ditaduras do passado, civis e/ou militares. Esta ânsia de a grande mídia corporativa televisionada pretender normatizar manifestações como "pacíficas" é de uma miopia histórica característica do liberalismo (o atual, que é status quo, que não é mais nem reformista, nem revolucionário, que se acredita no “Fim da História”). Qual parte da Revolução Francesa gostar-se-ia, hoje, de lembrar? Talvez nenhuma... Tudo isso é tão sintomático da domesticação dos problemas públicos!...

No liberalismo, o direito à propriedade precede o direito à sobrevivência. A propriedade é o mantra sagrado, embora a sacralidade seja socialmente seletiva: na casa do rico, só com mandado de segurança a polícia federal entra; na casa do pobre, particularmente na favela, a invasão sem cerimônia da PM (e o exterminismo racista de milícias) demonstra os limites sociais da vivência dos direitos formais liberais. E, durante a atual recessão, o estado opta por investir em saúde financeira monetarista para salvar especuladores financeiros com nossos impostos, mas é "vandalismo" atacar bancos... Não é ação política de protesto. É apenas vandalismo de oportunistas. Não há outra opção de sentido. É vandalismo e pronto!...

A questão é saber o que se "manifesta" como aceitável pela grande mídia na "festa cívica", o que se afirma, o que se silencia, o que se salienta, frente aos tantos partidos “trava-pauta” e sindicatos que se vendem fáceis, barganhando governabilidade e achando que somos todos estrumes. Como as bruxas ibéricas do passado, a minha mãe usa muito “estrume” na fala quando está irritada e se sente impotente. Sabemos disso: na maioria dos usos sociais que não envolvem ofensa verbal direta, o palavrão é um desabafo de impotência. A estrutura estritamente liberal de representação política no Brasil está falindo e conta com nossa síndrome de impotência “vira-lata” para manter o status quo – a menos que o “vira-lata” reaprenda a morder, em vez de apenas ladrar e viver de sobras... Por isso, insisto: É necessária a reforma política! Não sou cardume! É bom que saibam disso!

Manifestação não é para ser inofensiva. Se não é para incomodar, é melhor nem se fazer... Mas se é para incomodar, é bom que haja agenda clara e estratégias bem montadas de mobilização e sensibilização coletiva para além da “classe média”. Mas atentemos para isso: o nosso "estado de direito" tem adorado – com seu judiciário politicamente elitista, alienado e domesticado – criminalizar protestos e fazer presos políticos. Desconfiem de tudo que parece tão simples no enunciado midiático de qualquer dos lados da arena política! Como são cansativos os chavões de lideranças sindicais que domesticam "festas cívicas" para que caibam no “padrão Globo de qualidade”!

Aqui não faço incitação ao ódio, mas ao bom senso! Há muitos “donos de gado” por aí querendo ampliar seu pasto e acham que somos estrumes para fertilizá-lo. A grande mídia não nos mobiliza contra a violência estrutural, mas adora dramatizar a violência subjetiva. Rende mais anunciantes no “horário nobre”. Como é fácil cair nesta armadilha que esvazia nossa atenção da violência estrutural que massacra, sem alarido, a vida coletiva! Eis, agora, a austeridade econômica na Educação e na Saúde, depois de desperdiçadoras obras Olímpicas... Isso é um soco bem dado na cara de todos, mas vândalo é quem quebra banco...
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Dedico este desabafo aos meus pais, moradores de São João de Meriti (Baixada Fluminense), vilipendiados quando precisam de serviço médico público digno.

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