Daniel Baptista - COLUNA CAVANDO BURACOS
Uma modesta opinião minha: sou contra a pena de morte. Ela não acaba com a criminalidade, e cedo ou tarde todos morrem - os bons e os maus - dentro de uma visão maniqueísta de ver a vida. Abreviar a vida de alguém está longe de ser a solução para uma sociedade mais igualitária, não importa o crime, até mesmo os que provocam comoção social, espetacularizada por carniceiros midiáticos. Mas diante do caso de execução de Marco Archer, discussões sobre os episódios que culminaram no fato ganharam notoriedade em nosso cotidiano, especialmente a de que se a solução adotada na Indonésia seria uma solução para o narcotráfico nacional.
Já disse um famoso estadista que a morte de um é uma tragédia, a de milhões uma estatística. A morte de Marco Archer na Indonésia despertou uma avalanche de opiniões sobre o assunto. Os Bolsonaro’s boys vibraram nas redes sociais com a execução do brasileiro. Os ativistas dos direitos humanos condenaram com veemência a truculência e insensibilidade dos bárbaros e incivilizados indonésios. Mas uma fagulha de luz desse objeto se colocado sobre um prisma nos revela uma refração de fenômenos que nos dão uma mostra de que, os acontecimentos estão interligados com outros vários fenômenos que compunham a realidade
“Menino do Rio, com um calor que provocava arrepios e um dragão tatuado no braço”, Archer, segundo o próprio, nunca fez outra coisa da vida a não ser traficar, abastecer ricos com o seu produto que garantia felicidade e sexo sem limites era a única coisa que fez durante boa parte da vida. Talvez pelo fato do traficante nesse país ter cor e classe social, fez com que o episódio tomasse o contorno dramático a que nos foi colocado. Os mesmo que condenaram a execução de Marco Archer (ou parte dos espectadores) empolgam-se quando veem no Brasil Urgente ou em outra porcaria do tipo, mais um traficante preso na Restinga em Porto Alegre ou no bairro do Salgado em Caruaru. E está tudo bem nos corredores da morte no Texas. E vai saber, vai lá saber se, na calada da noite também não percorrem, algumas biqueiras de algumas periferias a procura de produtos que abasteçam a nossa demagogia, desde que não se fira a ética social.
É possível dizer Arche nãofoi a maior vítima deste episódio. Os mais vitimados estão nas selvas e na Cordilheira dos Andes que, por serem privados de dignidade e estarem condenados por uma vida miserável até o seus últimos suspiros, desaparecem no anonimato, vidas desperdiçadas para abastecer de pó às orgias hedonistas em paraísos terrestres como Bali. É uma estatística, como disse Djugashvili.
Como escrevi no início, não defendo a pena de morte em nenhuma situação. Digo isso com meu olhar e cultura ocidental, mas tomo muito cuidado para não cair na armadilha (que hora ou outra se revela) de ver outra sociedade e seus valores culturais como antagônica a minha. Não sou Charlie. Se eu fosse um cidadão indonésio, possivelmente estaria em sintonia com aquela sociedade, onde a pena de morte para traficantes de drogas é apoiada maciçamente pelos habitantes do maior arquipélago do mundo.
O que devemos fazer e creio que seja o mais sensato, é ter nesta hora respeito pelos familiares e amigos de Marco Archer que não tem nada a ver com as suas decisões que culminaram com a sua morte na Indonésia. E respeitar sim a jurisdição do país asiático. Aquilo é um problema deles. É complicado afirmar o que seria certo para eles, nem devemos ter essa arrogância. Existem outros fatores culturais daquela sociedade que são completamente diferentes dos nossos e que justificam as suas condutas, que os fazem ser o que são: nem melhor nem pior que outras. O contrário também é recíproco. Valores universais estão cheios de carga ocidental que, fizeram o que fizeram no Iraque, no Afeganistão e em tantos outros momentos da história. Pelo visto o inferno são os outros mesmo.
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